Páginas

domingo, 12 de maio de 2013

Quando já não há imaginação para a felicidade.

A Declaração Universal dos Direitos da Criança, explica de uma forma resumida as necessidades básicas para um crescimento saudável, harmonioso e feliz de todas as crianças. Que bom que todas vivessem na pratica a realidade daqueles direitos. Muito há para fazer. E não nos podemos focar apenas no 3º mundo. De uma forma diferente mas igualmente prejudicial os países mais ricos conseguem fazer tão mal, às suas crianças, como os países mais pobres. Nesses há outro tipo de guerras, outro tipo de fome, outro tipo de necessidades. 

As nossas crianças vivem hoje uma realidade que lhes permite ter acesso a bens (necessários e supérfluos), a assistência, a cuidados essênciais. Há instituições governamentais e não governamentais que zelam para que os seus direitos continuem a ser tidos em conta e de forma a que exista justiça no seu dia a dia.

Bla,bla, bla. Já todos sabemos o país que temos, a sociedade em que vivemos, a realidade que todos construimos. Nem vou por aí...

Hoje dei por mim a pensar um bocadinho mais nisto e inevitavelmente a fazer comparações, a tirar ilações e a deprimir com as conclusões.

O nível de exigência das crianças actuais subiu para patamares impensáveis. Não me refiro aos patamares da alegria, do amor, da justiça and so on..

O patamar dos bens de consumo. Aqueles que nós pais, juntamente com toda uma sociedade empolada pelo consumismo desmedido, lhes faz crer que são necessários à sua sobrevivência.

Eu não me excluo e admito mea culpa, mea maxima culpa, porque facilmente, como mãe vou na onda.

Hoje num grupo de partilha do qual faço parte, uma mãe pedia ajuda/opiniões para presentes de aniversário para uma criança de 4 anos que segundo as palavras dela, TEM TUDO.

A minha primeira reacção foi a de consumo, lá está. Limitei-me a sugerir um apadrinhamento de um animal no Zoo, pois o que me apetecia mesmo era sugerir a adopção de um animal doméstico. Mas rapidamente me caiu a ficha e imaginei o dito animal a ser tratado apenas como um brinquedo e então as imagens mentais não foram as melhores e desisti. Não sugeri mais nada. Limitei-me a ver as sugestões que iam aparecendo de outras mães como eu.

Não posso dizer que estou abismada com o que li. Eu sei a realidade em que vivemos. Todas as sugestões foram directamente para a casa do consumo puro. Mas então se ele já tinha TUDO, parece-me que tudo o que diziam só podiam ser repetições. Ainda surgiram algumas coisas interessantes, como idas ao teatro e coisas assim... mas o que mais me deixou focada nem foram as sugestões, mas sim a origem de tudo aquilo. A pergunta da mãe. O que pode representar nos dias de hoje, uma mãe vir a público pedir ajuda para encontrar o presente ideal para o seu filho, que aos 4 anos,  já tem TUDO?? Juro que não tenho resposta. Isto é um problema social a meu ver e podia perfeitamente ser abordado por várias perspectivas, mas eu limitei o meu pensamento.

A minha filha mais nova só tem dois anos. Feitos de fresco. Claro que nunca nos pediu presente nenhum, não tem ainda essa capacidade. O irmão até aos 4 também nunca o fez, curiosamente. Todos os presentes que foram recebendo (incluindo os dados por nós, pais) foram de acordo com a observação das suas preferências. 

Os meus filhos não têm TUDO, materialmente falando. Estão mesmo muito longe disso, comparando com alguns amigos próximos. Mas vão tendo algumas outras coisas, que no meu entendimento de mãe imperfeita, acho que têm mais valor. Vão tendo quem lhes transmita valores, princípios, quem lhes explique o respeito pelo próximo, pela natureza e até pelas coisas. As suas e as dos outros. Têm um animal de estimação que foi resgatado no canil, em vez de comprado e que aos poucos lhes vai ensinando, sem eles darem conta, uma outra forma de amor.

Vão tendo amor, alegria, condições que lhes permitem ter saúde. E brincam. que é para isso e por isso que são crianças.

Quando chegou o aniversário dos meus filhos e me vi naquela situação de não saber o que lhes oferecer, não era por não ter oferta suficiente, ou por não ter boas ideias. Foi simplesmente por ter a certeza que era apenas mais uma coisa e que não precisavam dela para continuarem a ser felizes.

Destas vezes em que não soubemos o que lhes oferecer, limitamos-nos a oferecer-lhes a festa de aniversário, que lhes marcou a memória. O dia em que partilharam alegria com a família e os amigos mais próximos. O dia em que mãe e pai se esfalfaram a criar um ambiente de festa que lhes proporcionasse alegria suficiente de forma a que não sentissem falta do tal presente que não lhes demos. (E na realidade, inevitavelmente recebem sempre imensos presentes oferecidos pelos amigos e família).

Confesso que ainda estou centrada no facto de alguém achar que uma criança aos 4 anos TEM TUDO. 

1 comentário:

  1. Conheço várias situações dessas, vários pais que usam exactamente a mesma expressão. "Têm tudo". É de facto chocante (ainda mais quando nos apercebemos que isto é dito com orgulho). Os meus filhos não têm tudo. Mas têm demais ainda assim. As festas de anos e Natal são, para mim, absolutamente assustadoras desse ponto de vista (eles já nem abrem as prendas!).

    Vou tentando gerir, dizer não, e uso a velhinha estratégia do mealheiro (o Manel tem dois, um para cada objectivo muito definido), para eles terem noção de quantas moedas são necessárias para concretizar os seus sonhos.

    Parabéns pelo texto fabuloso e por nos levares a reflectir sobre o assunto. Acredito mesmo que é o que faz falta a muitos pais.

    ResponderEliminar